Os meus pais, hoje na casa dos 70, apenas fizeram a instrução primária - primeiro ciclo. O meu pai calçou pela primeira vez uns sapatos quando foi fazer o exame da quarta classe na sede do concelho. Começou a trabalhar como metalúrgico aos 10 anos, a minha mãe começou com 14 anos numa empresa de fabrico de vidro, onde entrava às 8 da manhã e saia às 6 da tarde, tendo que percorrer a pé 6 Km por dia. Ainda me lembro dos meus pais trabalharem a semana inglesa (tinham que trabalhar ao sábado de manhã). Lembro-me de ser criança e a fábrica onde o meu pai trabalhava passar por dificuldades e dos trabalhadores estarem em greve. O meu pai era delegado sindical e lembro-me como se fosse agora, dele entrar em casa depois do trabalho com uma gaveta coberta de livros e debaixo desses livros estar dinheiro para entregar aos trabalhadores, para que eles conseguissem aguentar a greve, dinheiro esse angariado pelo sindicato, vindo de várias fontes. O dinheiro tinha que ficar bem guardado por causa da Pide e o meu pai trazia-o para casa até ele ser distribuído pelos trabalhadores, lembro-me do sobressalto que se vivia em minha casa nessas noites, com medo dalguma visita indesejada. O meu pai chegou a ser interrogado pela Pide.
Oiço muitas vezes os meus pais e outras pessoas contarem da miséria em que se vivia nesses tempos, em que uma sardinha tinha que ser dividida por vários membros duma família.
Tinha 7 anos em 25 de Abril de 1974, e fui para a rua festejá-lo sem grande noção do que se estava a passar, mas se os meus pais, gente trabalhadora e honesta, o festejavam e estavam felizes porque o país, as pessoas podiam finalmente viver em liberdade e com qualidade, acreditei e festejei.
Hoje, dia 25 de Abril de 2015, este país está uma merda, é verdade, mas apenas a mediocridade, a ignorância, o saudosismo bafiento podem afirmar que antes da revolução dos cravos é que isto era bom.
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